No mundo da moda uma das palavras que mais se ouve falar é tendência.

A tendência desse inverno são as jaquetas bomber. Ouve-se de alguém, mas vai me dizer que você não fica se perguntando: mas quem disse? De onde tirou essa ideia? Eu pelo menos sempre me questionei a cerca desse assunto. Porque parece que surge meramente da cabeça de alguém e plim, todo o senso comum adota e pronto.

Como essa questão sempre me importunou de alguma forma, pois não sou nenhum pouco lógica e para mim tudo tem que surgir de algum lugar, ter um como e por que, pois mágica só mesmo nos meus sonhos, percorri o caminho das pedras e lhes digo, essa palavra esconde muito mais do que uma roupa, cor ou tecido a ser usado. Aparentemente parece simples sua compreensão, porém há certa complexidade já que as tendências vão além da moda.

Não ela não surge da cabeça de uma única pessoa, e acredite, ela surge de nossas cabeças, sim, da minha, da sua, da do seu vizinho e do resto do mundo todo junto e de mão dadas.

Vem comigo que vou te explicar o que eu consegui descobrir e compreender até agora sobre essa palavrinha um tanto misteriosa, ou vai dizer que agora não ficou intrigado?

Vamos lá, em sua etimologia tendência vem do latim Tendentia, cujo significado é: tender para ou ser atraído por. Sendo assim conseguimos compreender que é algo que nos faz ter maior predileção por uma coisa, ansiar por algo. “O significado, inclinação e direção ao futuro está presente hoje no conceito de tendência, na forma como essa palavra está empregada na moda e no mundo dos negócios. As tendências sinalizam uma periódica convergência de escolha que partem do individual para o coletivo (Sabina Deweik).

A afirmação de Deweik cabe bem para os dias de hoje, mas historicamente falando as tendências começam a surgir, ou melhor, consegue se perceber esse comportamento na segunda metade do século 19, sendo na moda que aparecem os adventos das tendências com a alta costura.

O que notou-se na época foi que as classes mais desfavorecidas depois de um tempo começava a copiar a burguesia em seu modo de vestir, e logo a burguesia mudava seus modelitos para que não fossem mais copiados, e isso foi virando um ciclo. Sendo assim podemos comparar as tendências como um ciclo de vida humano. O estilista Christian Dior, na década de 60 afirmou que: “Existe para cada estação uma proporção determinada para a roupa feminina, proporção essa que estará fora de moda na estação seguinte. Porque? Porque em virtude deste processo de imitação que caracteriza essencialmente a moda, essas proporções tornar-se-ão banais se comumente adotadas, gerando grande tédio. É este tédio que destrona as modas e incita uma permanente necessidade de renovação”.

Sábias palavras de Dior para explicar o processo de adoção de uma determinada tendência que vira moda. Sim, para ser moda a tendência tem que ser adotada e seguida por uma grande parte da população.

Durante a segunda guerra, foram desenvolvidas técnicas de produção em larga escala para a confecção de uniformes e fardas. Logo após a guerra, essas técnicas permaneceram e foram adotadas por algumas grifes, surgindo ai o ready-to-wear ou prêt-à-porter, que nada mais é que o pronto para vestir. Neste momento as maisons de alta costura com várias grifes começaram a produzir aquilo que eles acreditavam como sendo o certo para a sociedade vestir. Com ambos os segmentos ditando tendências surge o que se chama de mecanismo industrial da moda.

Percebendo a possível confusão que isso poderia gerar, e para que todos falassem a mesma língua, foi criado em Paris no ano de 1955 o CIM (Comitê de Coordenação das Industrias da Moda), que tinha por objetivo criar uma unidade nas criações estabelecendo padronagens, cores, tecidos e etc. No entanto havia quem duvidasse deste comitê e acreditava que alguns estilistas se reuniam em Como na Itália para reuniões secretas onde eles mesmos decidiam o que seria adotado nas próximas coleções, o que não passa de uma lenda, contudo esse pensamento deixava o consumidor da época acreditando na sua incapacidade de escolha. Porém foi neste momento que a moda começou a travar um contato mais direto com o consumidor, saindo dos ateliers e escritórios de estilo e indo buscar nas ruas o que o consumidor queria, pois em 1960 um publico adolescente começou a exigir uma moda mais jovem.

Você deve estar se perguntando: – por que eu devo saber disso tudo? Eu já aviso, não é em vão, porque foi a partir deste comitê e esse contato mais próximo ao consumidor que começaram a surgir os bureax ou laboratórios e institutos de pesquisa de tendências.

“Do Comitê aos bureax de estilo poucos anos se passaram e nas décadas de 1960 e 1970 esses escritórios passaram a ter papel fundamental não só na pesquisa e definição de tendências de cada estação, mas também em divulgaçao através de seus consultores os cadernos de tendências, que apresentavam com 36 meses de antecedência o que estaria na lojas, da matéria prima às roupas”. (Sabina Deweik)

E é aqui que a coisa toda começa a ficar interessante, e ainda mais complexa. Pois há uma inversão no caminho de se chegar as tendências. Hoje esses bureax se transformaram em grandes empresas de pesquisas de tendências, e não pesquisam apenas só para a moda. Pois compreende-se tendência como resultado de vários fatores sociais.

Quando disse que eu, você e todo o resto do mundo somos responsáveis pelas tendências , quis dizer que essas empresas têm pesquisadores que estudam nosso comportamento diário, desde o que comemos até o tipo de música que estamos ouvindo, e esses são chamados de Cool Hunters. Eles levantam vários tipos de informação e vão cruzando dados, ideias, intuições, encontros, estilos de vida, habilidades e etc., e com isso conseguem entender a sociedade e traçar um perfil do consumidor daqui a dois anos. Ou seja, após sermos milimetricamente analisados, essas empresas conseguem ter uma ideia daquilo que possivelmente a gente vai ter vontade de usa, querer comprar ou comer daqui a dois anos.

Agira a pergunta, que tipo de pessoa faz essa pesquisa? Pessoas assim como eu e você que tenham feeling para coisa. Vamos lá: hoje o mercado oferece vários cursos na área de Cool Hunter, para se tornar um, são necessários alguns pré –requisitos próprios, ter um olhar aguçado para o diferente, olhar dos mínimos aos grandes detalhes, entre vários outros fatores.

Essa empresa trabalham também com sociólogos, psicólogos, economistas e vários outros profissionais, pois as pesquisas hoje tomaram grandes proporções e não são apenas para moda. Porque na moda trabalhamos com as micro tendências. O que as diferenciam são o tempo de duração, a micro no máximo dois anos, a macro de 10 a 15 anos. Quando digo outros campos, são eles: arte, design, comunicação, tecnologia, meio ambiente, medicina, política, economia, medicina, estéticas entre outros.

Em seu princípio as tendências de moda eram ditadas pelas classes mais abonadas e acatada pelos menos abonados. Por volta dos anos de 1980 e 1990 surgiram os trends seters, que nada mais eram pessoas que estavam na mídia e com grande visibilidade social, que usavam determinados produtos e indiretamente atingiam a população criando nas pessoas a vontade de ter o que eles usavam. Hoje com a velocidade da informação, essa forma de criar e transmitir tendências se dá de várias formas, além das pesquisas. Hoje se transmite tendências das ruas para as passarelas de um desfile e vice e versa. Por isso que digo que o processo é um pouco complexo. Ao mesmo tempo em que se olha para a possível necessidade do consumidor, se olha exatamente o que o consumidor está fazendo no momento, é um trabalho de presente e futuro. Uma troca que acontece entre as classes dominantes e as classes dominadas e vice e versa. Digo isso porque de fato me chamou atenção, a cerca de um mês em meio as festas do Rio Fashion Week, o cantor Seu Jorge fez uma festa no morro do Vidigal no Rio de Janeiro, e quem estava lá? Muitos artistas, blogueiras, modelos, papizas da moda, é engraçado como neste momento subir p morro ficou VIP.

Hoje se paga fortunas para pessoas com grande visibilidade para promoção de produtos que nos deixam doidos, mesmo quando não precisamos nós queremos. E a manipulação da informação está por trás disso, mas isso é um assunto para outro dia. Mas vamos pegar o instagram que é um aplicativo que está mais do que inserido em nossas vidas e ver do que ele é capaz. Hoje ter o aplicativo é uma forte tendência tecnológica, pessoas passaram a comprar celulares smartphones para poder usufruir do aplicativo, porque o discurso é: se você não está no instagram, não está no mundo. Através dele muitas pessoas se tornaram ícones de beleza, fitness, moda, etc., porque o que importa nesta ferramenta é quantos seguidores você tem. Usando um exemplo dentro do aplicativo é a blogueira Gabriela Pugliesi, em menos de um ano ela criou um blog, conquistou mais de 500 mil seguidores e escreveu um livro, tudo isso é sorte, não? Ela soube usar a ferramenta, talvez em seu inconsciente tivesse noção do que estava fazendo porque hoje a sociedade está muito voltada a cultuar o corpo, em manter uma alimentação saudável, e ela postando sua rotina atingiu esse nicho, ou seja, ela captou essa tendência e investiu nela, o que fez com que lhe gerasse bons e lucrativos frutos, porem ela não utilizou de nenhuma pesquisa. Algumas pessoas têm feeling

Quando entramos no campo da moda devemos saber que existem empresas especializadas a esmiuçar essas pesquisas e entregar tudo praticamente pronto para seu cliente. No caso do Brasil, o Senac tem uma equipe de profissionais que sai a campo para fazer essa pesquisa, e duas vezes por ano apresenta seu material no Senac Moda e Informação, trazendo para o público um prospecto do que poderá ser usado como tendência no mercado. Onde eles buscam essas informações? Em desfiles, lojas, e nos próprios laboratórios como o WGSN, Portal Use Fashion, Mandala, Future Concept Lab, Carlin. E assim criam seus cadernos de tendência e apresentam ao público (lojistas, estilistas, etc.) sempre com um ano de antecedência. Já em Paris duas vezes ao ano acontece a Première Vision que antecipa as tendências para o mundo do que possivelmente será moda daqui dois anos. Então resumindo, tendência é uma aspiração social que determinadas empresas de pesquisa conseguem captar, fazer uma releitura e devolver para nós em forma de cores, modelos, cheiros, gostos, comportamento e etc. Deu para captar?

Eu disse desde o princípio que o sistema era complexo. Embora tenha compreendido essa “matemática” afirmo que ainda estou esmiuçando o assunto, porque ele rende muito pano pra mango viu…

Jaquetas Bomber

Conheçam um pouco mais da historia dessa peça que voltou com tudo nesta estação!

Para algumas pessoas essas peça pode parecer uma novidade, mas não é. Como é engraçado ver que algumas tendências vão e voltam, porém quando voltam ou revivem, vêm em outra releitura, outros tecidos, cores, etc. Normalmente o tempo que leva para uma tendência ser ressuscitada é cerca de dez anos após o seu último declínio.

A bomber jacket nada mais é do que a jaqueta aviador, o modelo com zíper na frente e colarinho, tem a cintura e os punhos canelados e geralmente apresenta bolsos lisos na frente, cortados em diagonal.

Ela surgiu das jaquetas usadas pelos pilotos de caça americanos durante a Segunda Guerra Mundial. Em 1930 a empresa Schott Bros., de Nova York desenhou o modelo a pedido da Força Aérea Norte Americana. Na época das guerras os soldados iam customizando suas jaquetas, colocavam botons, bordavam diversos desenhos sempre relacionados as conquistas que tinham durante as batalhas.

Esse modelo se tornou muito popular com Tom Cruise, no filme Top Gun – Ases Indomáveis de 1986. Nesta época, o modelo G-1, usado pelo ator no longa, imortalizou um tipo de casaco, que rapidamente foi adotado pela juventude da época e por universidade que os adaptaram aos varsity jackets, tipicamente usados pelos alunos com símbolo de cada escola.

Então podemos dizer que até ela chegar na releitura que temos hoje a jaqueta bomber, sofreu várias transformações. Na tendência atual que vem dando pinta desde p inverno passado ela vem bem casual e prometendo ser uma peça para dar mais charme e graça aos nossos looks de cada dia nada básico. Então vamos abusar e criar looks incríveis com essa jaquetinha que tem história. E ela deu as caras nas passarelas de marcas como Prada Dsquared2 e Haider Ackermann.

Um Pouco de História

Na metade do séc. 19 o estilista inglês Charles Frederick Worth, com seu talento para a costura chamou a atenção da imperatriz francesa Eugênia, esposa de Napoleão III, com suas criações e a partir de então foi ele quem começou a ditar moda em Paris e consequentemente por toda a Europa. É considerado o primeiro estilista a fazer desfile com modelos.

Charles Frederick Wort e Emperatriz Eugenia de Montijo

Podemos dizer que é com Charles que começaram a surgir as primeiras tendências de moda, pois na época sua Maison introduziu a ideia de inovação, com o lema Hautes Nouveautés (Altas Novidades), foi ele também quem criou a figura do grand couturier, o costureiro “ditador de moda”. Como ele fazia desfiles com modelos, suas criações respeitavam apenas o seu gosto pessoal, e desta forma impunha para a sociedade o que deveria ser usado. Apenas ele podia dizer o que era chique e elegante. Suas roupas eram adquiridas apenas pela classe privilegiada e posteriormente a ideia era absorvida pelas classes menos favorecidas.

Assim podemos afirmar que a alta costura foi pioneira no lançamento de tendências, ditando conceitos, formas, estilos, cores que seriam imitados pelas industrias e pelo resto do mundo. Desde o surgimento da alta costura até a década de 60 podemos observar a moda como uma organização estável o suficiente para ser chamada de “moda dos cem anos”. Durante cem anos a definição de tendências dependeu quase que exclusivamente das visões de moda propostas pelos costureiros franceses.

Esse quadro começa a mudar depois da Segunda Guerra, quando passou a existir uma industrialização da moda e um maior questionamento da sociedade a respeito de quais tendências queriam seguir ou não. O caminho começa a mudar o rumo com a criação do CIM (Comitê de Coordenação das Industrias da Moda).

Book Senac

Tive a oportunidade de participar por duas vezes do Senac Moda e informação, e posso dizer que é muito bacana. Um dia todo de palestras, debates, e muita informação sobre as próximas tendências.

Eu fui no inverno de 2013 e no de verão de 2014 e tenho os tão famosos cadernos de tendência.

Como podem ver o de inverno é um fichário com todos os temas, cartela de cores, padronagens, tecidos, etc. Já na edição de verão eles inovaram e fizeram o book de forma digital, mas com o mesmo conteúdo, só mudaram a forma, porque a tendência agora está pendendo para a nano tecnologia, a diminuição de espaço físico, e de preservação do meio ambiente, não imprimindo, não se gasta papel. Muito bacana essa opção.

Jornal Atual Mercado Edição 2 – Ano 01 – Maio de 2014